Fiquei pensando que esta experiência, desde a organização para que todos os interessados pudessem estar lá, até as conversas com as pessoas que estavam juntas em um carro, na ida e na volta, e também a participação das crianças, incluindo a minha filha, nesta movimentação, já foi uma vivência de transformação intensa, um tipo de experiência "formativa" que me remete a este trecho do livro do Larrosa, em Pedagogia Profana:
A formação é uma viagem aberta, uma viagem que não pode estar antecipada, e uma viagem interior, uma viagem na qual alguém se deixa influenciar a si próprio, se deixa seduzir e solicitar por quem vai ao seu encontro, e na qual a questão é esse próprio alguém, a constituição desse próprio alguém, e a prova e a desestabilização e eventual transformação desse próprio alguém"
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Chegamos em tempo de ver o mestre José Pacheco falar de educação. Legitimar o que já sabíamos, sobre parar de dar aulas. E ainda que eu não tenha ouvido tudo, porque quem desescolariza leva os filhos em palestras e divide a atenção o tempo todo, o que ouvi me fez ver o quanto eu ainda preciso aprender. Ou melhor, desaprender.
Algo me chamou muito a atenção. Pacheco fala em coerência. Devemos ser coerentes. E depois, em vários momentos com a minha filha, fiquei atenta, observando-me em meus pedidos a ela e nos exemplos que dou. Percebi que a coisa mais difícil é ser coerente. Esse é o desafio a enfrentar, agora. Posso dizer, sim, claro, ser coerente. Mas na vida, a incoerência que vivenciei está em mim, e praticar coerência é revolucionário. É praticar ética e respeito. Tem um trecho escrito por outro José, também português, o Saramago, que me faz pensar pensar pensar, e que também vem de encontro a este momento de reflexão (afinal um mestre pode se contradizer, mas jamais poderá ser incoerente):
"[...] incoerência e contradição não são sinônimos. É no interior da sua própria coerência que uma pessoa ou uma personagem se vão contradizendo, ao passo que a incoerência, por ser, bem mais do que a contradição, elimina-a, não se estende a viver com ela. Deste ponto de vista, ainda que arriscando-nos a cair nas teias paralisadoras do paradoxo, não deveria ser excluída a hipótese de a contradição ser, afinal, e precisamente, um dos mais coerentes contrários da incoerência". (A CAVERNA, p.218)